Galões de plástico na percussão. O braço do violino ganha corpo a partir da panela velha e lata de biscoitos. Carrinho de mão faz a vez do contrabaixo. Saxofone é cano de PVC. A forma que não assa mais lasanha vira violão. A guitarra é de lata. E o piano – que é formado por garrafas de vidro com água em diferentes níveis até atingir a nota musical desejada – entre outros instrumentos produzidos a partir de materiais recicláveis, ditam a melodia. Na Orquestra de Sucata, o que era lixo se transforma em música e a diversão se mistura à conscientização ambiental.
A Orquestra de Sucata tem a realização do Ministério do Turismo, Secretaria Especial da Cultura do Governo Federal, via Programa Nacional de Apoio à Cultura (Pronac) – Lei Rouanet. Em São Caetano do Sul, cidade considerada a mais sustentável do Brasil de acordo com ranking do Instituto de Cidades Sustentáveis, divulgado em julho, o projeto conta com o apoio da Prefeitura, por meio das secretarias de Cultura e de Educação.
Ritmo vibrante
A vibração do ritmo conduzido pela Prof. DóRéMi (Rosa Alice) acompanha a energia contagiante do auditório lotado com cerca de 200 crianças do 1º ao 5º ano da EMEF Dom Benedito Paulo Alves de Souza, em São Caetano, a primeira de sete escolas de ensino fundamental atendidas pelo projeto Orquestra de Sucata – Música e Reciclagem no ABC Paulista.
Desde outubro, foram 14 apresentações em escolas de ensino fundamental da cidade e duas na Fundação das Artes. Na última quarta-feira (16/11), a apresentação de encerramento da Orquestra de Sucata ocorreu no Teatro Santos Dumont, para um público superior a 350 pessoas.
A Orquestra de Sucata trabalha com diferentes estéticas musicais, adaptando linguagem e repertório ao seu público, sem deixar de valorizar a música popular brasileira. Na EMEF Dom Benedito, teve cantigas, baião, Ary Barroso (Isto aqui o que é?), além de faixas autorais com temática sustentável. A apresentadora Prof. DóRéMi, conduzindo as coreografias, estimulava a participação de todos. Como material de apoio, folders informativos com sugestões de atividades foram distribuídos para as crianças e aos professores, como auxílio em sala de aula.
Nas palavras da professora do 1º ano, Cristina Manieri: “Apostamos que, por meio da arte, da cultura, a mensagem que a Orquestra de Sucata nos traz possa fazer a diferença: de que a consciência ambiental passa pelo respeito e pelo cuidado mútuo.”
Sombra de som
A ação é parte do projeto “Sombra de som”, da Prefeitura de São Caetano do Sul, por meio da Secretaria de Cultura em parceria com a Secretaria de Educação. Foram 15 escolas da rede municipal de ensino atendidas ao longo do ano.
“A etapa inicial do projeto, realizada no primeiro semestre, levou grupos de trombonistas, de saxofonistas, de flautistas, além dos profissionais dos instrumentos de base (bateria, contrabaixo, guitarra, teclado), até as escolas da cidade. Cada instrumento de orquestra e banda, então, era apresentado pelos músicos aos alunos. E cada criança, além de conhecer os instrumentos, teve a oportunidade de conversar com os músicos”, explica o maestro e idealizador do projeto, Ogair Júnior, da Secretaria de Cultura de São Caetano.
Foram realizadas apresentações com diversas práticas instrumentais para estimular a curiosidade e o conhecimento de diferentes estéticas musicais. “A percepção de novos sons, silêncios, melodias e ritmos incentiva os alunos a uma nova experiência por meio da escuta e dos sentidos em geral, além da descoberta de novos gostos musicais que estimulam o desenvolvimento da capacidade criativa”, explica Ogair. O público impactado pelo projeto Sombra de Som/Orquestra de Sucata supera quatro mil pessoas.
Orquestra de Sucata
A Orquestra de Sucata nasceu na cidade de Santa Maria, no Rio Grande do Sul, entre 2001 e 2002. “Fomos contratados para dar aula em uma escola onde os alunos não tinham condições para comprar os instrumentos musicais. Então, surgiu a ideia de confeccioná-los”, relembra Rosa Alice, a Prof. DóRéMi, apresentadora e coordenadora artística. E a Orquestra foi tomando corpo, da percussão para os melódicos. O projeto foi para São Paulo no início dos anos 2010, por meio de leis de incentivo.
Acessíveis e inclusivas, as apresentações contam com a presença de intérprete de LIBRAS (Raqueline Garrido) e material informativo em Braile. A Orquestra de Sucata tem por público-alvo crianças de 5 a 12 anos:
“A Orquestra de Sucata é livre para todos os públicos. Particularmente me identifico muito com o infantil, e poder plantar uma sementinha nas crianças, poder dizer que cada uma faz a diferença onde vive, cuidando do meio ambiente é o que nos move. Estreamos com chave de ouro em São Caetano, com uma energia maravilhosa, auditório lotado. Esperamos que, ao sair da porta do auditório, a galera possa lembrar da mensagem: ‘pare, pense, preste atenção!’ É o que faz valer a pena”, conclui Rosa Alice.
“Amamos trabalhar com crianças. Superamos 70 apresentações, na Região Metropolitana e capital. É sempre essa energia; as crianças são curiosas: sempre querem saber mais. E só é possível levarmos esse projeto às escolas públicas de maneira gratuita por conta das leis de incentivo à cultura”, afirma Duval Silveira, produtor e diretor da Orquestra de Sucata.
O grupo possui CD autoral gravado com 10 faixas, tendo a responsabilidade ambiental por temática, vídeos tutoriais no site http://orquestradesucata.com.br e Youtube, ensinando a produzir instrumentos musicais a partir de materiais recicláveis.